Com a participação de cerca de 100
pessoas de pelo menos 10 unidades da federação, o 11º Encontro Nacional
de Entidade Praças (Enerp) discutiu os temas mais importantes para os
praças militares do Brasil e deu um salto de qualidade em apresentação
de propostas. Realizado em Manaus e organizado pelas diretorias da
Associação de Praças do Amazonas (Apeam) e da Associação Nacional de
Praças (Anaspra), o encontro também foi importante para atrair os
policiais e bombeiros militares da região Norte do país para os temas da
Anaspra – região extensa e pouco povoada, mas que conta com
experiências importantes na composição do movimento de praças.
O salto de qualidade da discussão se deveu principalmente no debate
sobre a organização dos praças do Brasil. Enquanto alguns defendem que
os policiais e bombeiros militares devem buscar a regulamentação dos
direitos de sindicalização e de greve, tal como os sindicatos de
servidores civis; outros acreditam que é melhor deixar como está,
afinal, o sindicalismo brasileiro, majoritariamente formado por
sindicatos oficialistas e sindicalistas pelegos, não serve de exemplo
para a organização dos militares estaduais.
No entendimento do diretor da Associação de Praças de Santa Catarina
(Aprasc) e da Anaspra, cabo Everson Henning, as associações de praças e
seus movimentos reivindicatórios têm mais autonomia de ação do que a
maioria dos sindicatos do Brasil. “É uma situação contraditória: Somos
um movimento híbrido, quando atuamos como sindicato e como movimento
social, na medida em que lutamos por direitos humanos, como o direito de
expressão, já que os demais sindicatos já tem esse direito”, explicou
Henning durante os debates.
O que todos debatedores e participantes concordam é que o movimento dos praças brasileiros, através Anaspra, deve qualificar sua auto-organização e ampliar sua participação. Para isso, foi defendido, que é preciso fortalecer a mobilização e o “lobby” das entidades estaduais em Brasília, onde praticamente todas as decisões são tomadas. Mais que isso, as entidades estaduais devem assumir a participação nos espaços consultivos e deliberativos de âmbito federal e estadual nos temas relacionados à segurança pública, direitos humanos e trabalhistas.
Ciclo completo e desvinculação do Exército
A conquista do chamado ciclo completo para a Polícia Militar e o Corpo
de Bombeiros Militar, ou seja, atribuição dada à mesma corporação
policial das atividades de repressão e manutenção da ordem pública e de
polícia judiciária ou investigação criminal, continua uma bandeira
defendida pela diretoria da Anaspra. No entanto, conforme frisou o
presidente da associação nacional e da Aprasc, cabo Elisandro Lotin de
Souza, o ciclo completo só continuará sendo apoiado pelos praças do
Brasil se vier ao lado da carreira única, da desvinculação das
instituições de segurança do Exército da instiuição da jornada de
trabalho. “Somente a adoção de ciclo completo não resolverá os problemas
da segurança”, afirmou.
Um dos temas mais polêmicos, a desvinculação do Exército, ganhou ares
de necessidade e urgência, apesar de não haver consenso sobre o tema, em
especial da delegação da Associação de Praças de Minas Gerais
(Aspra-MG), uma das maiores do país. O presidente da associação,
sargento Marco Bahia, acredita que é possível viver, com dignidade e
respeito, dentro de militarismo quando as instituições militares
estaduais, em todo o país, abolir o regulamento disciplinar e aplicar
código de ética – a exemplo da experiência mineira.
O discurso mais enfático partiu do deputado estadual e presidente da
Associação de Praças da Bahia (Aspra-BA), soldado Marco Prisco,
recentemente reincluído nos quadros da PM baiana e um dos militantes
mais participativos no movimento nacional de praças. Para o parlamentar,
a desmilitarização é uma questão de vida ou morte dos agentes da
segurança pública e da própria qualidade do serviço oferecido para a
população.
Caminhando ao lado da desvinculação do Exército, a reforma do
regulamento disciplinar como um primeiro passo, também foi fartamente
debatida no Enerp. Diretor Regional Nordeste da Anaspra e da Associação
dos Bombeiros Militares do Rio Grande do Norte, o soldado Rodrigo
Maribondo, foi dos que falaram sobre o assunto para defender a medida
como ferramenta para dar dignidade aos policiais e bombeiros militares.
“Como você quer que o policial trate as pessoas com respeito se ele
mesmo não é tratado assim dentro dos quartéis?”, questionou.
Convidado especial para o encontro, o advogado e membro do Conselho
Nacional de Direitos Humanos Rildo Marques defendeu que a categoria deve
buscar a adaptação dos direitos dos policiais e bombeiros militares aos
direitos sociais da Constituição Federal de 1988. Militante histórico
do movimento de direitos humanos, Marques rechaçou a cisão existente
entre os policiais e os militantes de direitos humanos. Em sua opinião,
essa divisão é criada “artificialmente” para separar dois grupos que têm
mais pontos em comum do que diferenças, e que, no final das contas, tem
o mesmo objetivo: garantir os direitos de todos os cidadãos.
Segundo ele, as instituições de defesa dos direitos humanos também
atuam por melhores condições de trabalho e pela garantida dos direitos
constitucionais dos policiais e bombeiros militares. “O movimento
nacional de direitos humanos não aceita que a punição disciplinar seja
tratada como um castigo dentro das corporações”, exemplificou.
Além de lideranças das associações regionais, o Enerp contou com a
participação de seis parlamentares da classe dos militares, entre
deputados estaduais e vereadores, bem como teve a presença de
representantes de mandatos de deputados federais.
Texto e Foto: Alexandre Brandão (Anaspra)